Reencontros apaixonantes

A política brasileira anda tão envolvente que fica difícil se desligar dos temas nacionais para pensar em arte e lazer. O roteiro pronto para filmes futuros, com viradas de trama de dar inveja ao mais talentoso escritor, rouba a atenção de qualquer leitor – até porque trabalhar é preciso, viver, nem sempre tem qualquer precisão, fica bem mais no campo da aventura. Neste Brasil atual, que discute educação, comportamento e moral, destroçando a ordem e o progresso ao derrubar leis trabalhistas e previdenciárias, alhear-se da realidade é uma das maneiras de encontrar serenidade para a sobrevivência.
Melhor antídoto para as tristezas, o amor é movimenta os personagens  de Me encontre (Intrínseca, R$ 49,90), em que o egpicio André Aciman retoma as trajetórias de Elio e Oliver, os namorados de Me chame pelo seu nome (Intrínseca, R$ 36,90). O best-seller,  que teve as vendas catapultadas pela adaptação cinematográfica –  só no Brasil foram comercializados 70 mil cópias – levou um merecido Oscar de roteiro adaptado. Quem inicia a viagem ao passado, mas sempre buscando um futuro diferente e auspicioso, é Samuel,  pai de Elio, agora um pianista profissional, vivendo com um homem mais velho em Paris. Oliver, professor e pai de família nos Estados Unidos, volta à Europa para reviver o enlevo juvenil. Delicadamente, Aciman fala dos dilemas da a vida contemporânea sem preconceitos de gênero, apresentando a intensidade do amor que desconhece convenções sociais anacrônicas, embora respeite as estruturas das famílias constituídas.
A paixão pelo futebol, um traço da nacionalidade brasileira, traz alento aos que sofrem – mesmo os que perdem campeonatos. No momento, o Flamengo faz jus ao título de Mais Querido, com brilhantes campanhas dentro e fora do Brasil. Um dos mais eméritos de seus torcedores foi o escritor José Lins do Rego, que teve 111 de suas 1571 crônicas esportivas – publicadas no Jornal dos Sports entre 1945 e 1957 – reunidas e comentadas por Marcos de Castro em Flamengo é puro amor (José Olympio, R$ 47,90). Reencontrar aquela época, o Rio, então Distrito Federal, e a alegria do torcedor é delicioso até para os que não admiram o rubro-negro. Aparentemente, algumas características se mantêm no Rio de Janeiro, ainda que não na Lagoa Rodrigo de Freitas, por onde José Lins caminhava, em 1945, para chegar ao  estádio do Flamengo. “A manhã era toda de uma festa de luz sobre as águas, os morros. (…) os pássaros do arvoredo da Ilha do Piraquê cantavam com alegria de primavera. (…) o cronista foi encontrando soturnos urubus, a passearem, a passo benzeiro, por cima do lixo, das imundices, dos animais mortos, de toda a podridão que a prefeitura vai deixando ali, por detrás dos muros do Jóquei Clube.  (…) O pobre cronista (…) teve de correr para fugir (…) daquele cenário nauseabundo. A manhã era linda, e o sol, apesar de tudo, brilhava sobre o lixo, indiferente a todo aquele relaxamento dos homens”. O futebol fica esquecido na crônica, mas para Zé Lins, um “ecologista avant  la lettre”, segundo Marcos de Castro, revolta que, sem infraestrutura sanitária, a rua se tornasse um depósito de lixo.  Hoje, a sujeira se restringe às águas da Lagoa, poluídas pelos lançamentos ilegais de esgoto dos condomínios em seu entorno.

Comentários

Postagens mais visitadas