Natal de muitas leituras

Agora que dar livro virou moda natalina, esta coluna, vanguardista que só, lembra que livro nunca foi presente, mas gênero de primeira necessidade. Só procuramos motivos que justifiquem adquirir mais um. E o Natal é um deles. Então,  vamos à derradeira e breve lista de sugestões natalinas!
Depois deste ano para lá de conturbado, nada melhor que refletir sobre a teimosia da Humanidade em cometer mancadas homéricas com Humanos – Uma breve história de como fxxxxdemos com tudo (BestSeller, R$ 44,90), do jornalista inglês Tom Phillips. Os paradoxos da espécie que domina o planeta são expostos a cada página, quando o autor lembra que conseguimos mandar o homem à Lua, mas acreditamos em boatos divulgados pelas redes sociais. Ou que megalópoles como a Cidade do México, em 1989, na tentativa de reduzir a poluição ambiental, proibiram a circulação de veículos seguindo um rodízio na numeração de placas. Como em outros lugares do mundo, muita gente comprou mais carros para poder se deslocar sem usar transporte público.  Mais do que criar um almanaque de casos pitorescos, Phillips, que tem formação em História e Antropologia e está à frente de uma agência de checagem de notícias na Inglaterra, analisa – com muito humor – a trajetória do homem desde seu aparecimento na Terra.
Humor não faltava a Giovanni Boccacio quando lançou, em 1353, o Decamerão(Nova Fronteira, R$ 94,99), uma série de 100 contos que rompiam frontalmente com a severa moral baseada no catolicismo da época. As histórias são contadas por um grupo de sete moças e três rapazes que se isolam numa vila isolada de Florença,  buscando fugir da Peste Negra. Os contos têm erotismo, amor, sarcasmo e tragédia, quase sempre com divertidas lições de vida apontando para a superação do momento preocupante que enfrentavam. Homens e mulheres são mostrados cruamente de forma ainda não abordada pela literatura da época. À frente de seu tempo, o ousado Boccacio registra os hábitos de uma sociedade diante do flagelo – que se entrega à luxúria desenfreada ou se recolhe, devotando-se à oração, além de um grupo grande que adere a qualquer uma das práticas.
Dez argumento para você deletar agora suas redes sociais (Intrínseca, R$ 34,90), de Jaron Lanier,  dá seu recado no título. O autor, músico e dos mais reconhecidos especialistas em realidade virtual,  explica a razão de seu livro: como permanecer independente em um mundo de vigilância contínua, sob estímulos incessantes de consumo imediato. Outro aspecto preocupante, lembra Lanier, é a manipulação desses dados por robôs que vão utilizá-los para a disseminação de programas políticos. O vício de viver ligado na Internet, acaba formando uma multidão de crédulos, que não questionam as informações divulgadas, mesmo absurdas. Exemplos foram registrados – e a eles creditados a vitória de um candidato – nas eleições presidenciais brasileiras, em que se discutiu mais  a respeito de objetos inexistentes, como o  ‘kit gay’ e mamadeiras com bicos fálicos, do que programas governamentais.
A cegueira das massas é um dos temas de Umberto Eco em O Fascismo Eterno(Record, R$ 29,90), lançado em 1997, que acaba de ganhar nova edição brasileira. Ao identificar 14 características do fascismo – medo do diferente, oposição à análise crítica, machismo, controle da sexualidade e exaltação de um líder, entre outros – Eco alerta para a ameaça constante que vive a sociedade democrática de ser dominada por um sentimento discricionário e reducionista, calcado na desigualdade. Afirmava Eco que a liberdade é uma tarefa inacabável e da qual não se pode descuidar, sob pena da repetição do mesmo regime de exceção.
Um Natal pleno de boas leituras para festejar a vida!

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